Estudos Curitibanos

O trem apita na Ferrovia, quase não o consigo ouvir do meu quarto de hotel. Abro a janela para que apite mais alto. Deixo soar seu apito, deixo entrar sua insistência estridente e o vento se enfia pela fresta descoberta. Faz frio em Curitiba e o velho céu continua acinzentado.

Já cumpri com meus compromissos e agora nada resta a não ser rememorar os dias passados.

– A noite é uma criança, me diz um luminoso piscante.
– Já cresci há eras, me lembra o relógio intransigente.

Não estou em casa, não há praias por aqui. Mas há poemas, e escritores, e amigos e cafés…
Curitiba é também minha terra. Não fossem as saudades daqueles olhos de planetas, quem sabe estaria em casa agora…

(…)

Esses pinheiros centenários, essa neblina branca e densa. Penso em quanto conhece estas madeira, quanto já viram da história desta nação submissa e estranha.

É hora – de novo este relógio insistente – fecho a janela para que não entre mais o vento.
A esta altura já não há mais apito e tudo em que consigo pensar é na sabedoria estóica daqueles pinheiros centenários.

=Dom

Etimologia da selva

De como um velho perdeu um porto e
um porto ganhou um velho para chamar de seu…

Um taxista me contou, e os taxistas sempre sabem das coisas, que o nome desta cidade nasceu da supressão dum adjunto adnominal restritivo de posse.

Dizia que, antes de Porto Velho ser conhecida, havia um rio, um velho e um porto. O caso é que o velho morava solitário próximo ao porto, e sempre que os viajantes desejavam atracar por estas bandas, usavam a expressão: “- vamos ao porto do velho”. A medida que as barbas do velho cresciam a expressão se propagava entre os barqueiros, e por fim, quando o velho jazia sem barbas e sem espírito a expressão se eternizou.

Como no norte, semelhantemente ao nordeste, há um enorme senso de urgência no falar, tudo precisa ser comunicado com o menor emprego possível de palavras. E, por respeito as leis da eficiência, foi-se cortando tudo o que não era essencial – cortou-se o “do”. O velho, que “in memoriam”, já não se importava em ser lembrado, deixou de existir também na expressão, perdeu seu porto e o porto, que de velho não tinha nada, ganhou um “velho” para chamar de seu.

Depois de toda esta confusão, quem agora ostenta as barbas brancas é o Porto, que já não é mais porto, mas cidade. Do velho ninguém mais lembra. O rio segue seu curso caudaloso e o “do” que foi suprimido, ficou na história, afinal, quem mesmo precisa de um adjunto adnominal restritivo de posse!?

=Dom

Repente na mente

Pandeiro, esperança, viola;

As palmas não forram os pratos,
Crepitam imensa fogueira no ar…

Esperança, viola, pandeiro;
O povo na praça, a praça no povo,
O dia na noite, o sertão no luar;

Pandeiro, viola, esperança;
O gado não morre, a chuva não falta,
O bucho não ronca e o sertão vira mar;

=Dom,
(da Série Cantando o Brasil)

Porto Alegre

O porto encontrei,
O alegre ainda procuro

Uma infusão interminável
De cores, cheiros e sons

Prostitutas com pouco pano
E pouca beleza balançam as bolsas
E exibem as pernas

Negrinhos sem futuro ou esperança
Fumam num canto da praça

E eu, que já visitei o porto
E o rubro estádio internacional

Procuro sob as lajotas
O alegre do qual falava Mario Quintana…

=Dom