Vassalos do Tempo

Quisera o amanhã chegar-se no hoje
Para na fenda do tempo encontrar no espaço
Teus olhos perdido no nada que fui

O tempo, senhora, é de si mesmo carrasco
E o espaço, uma mera substância da poética
metafórica da vida essencial

Nós, os vassalos das coordenadas,
remimos no espaço o tempo que nos domina
– somos do tempo escravos –
E no espaço, timidamente, exprimimos nossa
Performance do Mouro de Veneza,
ou da Bahia, ou da cidade que nos melhor convir

O espaço, criança, é o palco de nossos dias
e o tempo faz às vezes do gordo birrento
que decide quando é hora das cortinas se fecharem,
das luzes se apagarem e da platéia seguir-se
aos aplausos esparsos e de pouco entusiasmo…

=Dom

Newton

Uma curva é, essencialmente, uma reta humilde – uma linha que se permitiu corrigir a direção por infinitas vezes.

Talvez – e digo somente talvez – seja neste princípio que o porquê da corcunda dos velhos tenha fixado sua residência…

Vai ver a gravidade é professora, e, se assim for, a corcunda deve ser o diploma de formatura da concorrida escola da vida…

=Dom

(Pensando a Gestalt no busão)

Sexta Fera

Já foi a semana, Ana;
O que se fez do dia, Bia?

Não brinquei feito criança, dança;
Nem curti poesia, Lia.

Acabou-se a prosa, Rosa;
O que se fez do dia, Bia?

Não dancei quadrilha, família;
Nem roda cutia, Lia.

Hoje a sexta é fera, Vera;
Hoje não é dia, Lia.

Mas não tenha medo, Pedro;
Sem melancolia, Bia…

Semana que vem faremos tudo novamente…

=Dom

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Duma mente cansada em uma sexta ingrata…

Poema às avessas

Controverso, o escritor, contra o verso escrevia

– Poucos entendem o que dizes, gritavam…
– Poucos compreendem a arte, se ria…

E assim, contra o fluxo letárgico dos homens,
contra a barbárie da incoerência,
tecia no tear de Láquesis o destino que o consumia.

– Poucos querem tua arte, gritavam…
– Poucos podem ter arte, se ria…

Contra o verso, o escritor, controverso vivia
e no tear de Átropos seu destino escorria.

– Poucos lêem teus textos, gritavam…
– Nunca escrevi para todos, se ria…

=Dom

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Um estudo cômico dedicado aos contemporâneos
colegas de arte e sua imensa anti-platéia.

 

Poema triste

Faz tempo que
não moro mais
na minha rua

Nem crianças,
nem velhos.
Nenhuma viv’alma,
nem uminha!

Nunca sei pra onde fui
Nunca sei pra onde vou
Nunca sei pra onde moro

Eu sou o poema mais triste
para compor numa quarta-feira
e quando for quinta
o sol de quarta ainda estará no céu

Faz tempo que
não moro mais
na minha rua
Faz tempo que não
sei onde morar

Sou uma casa
sem portas, janelas
ou trancas que se possa
forçar para que entre a luz

=Dom